“Poliana Vega de Souza” é uma muçulmana de 28 anos, convertida ao Islã e mora em Vitória, no Espírito Santo. Há dois meses, em um ponto de ônibus com a amiga, após saírem da mesquita, uma desconhecida homem apareceu e começou a gritar com eles. Tanto D’Souza quanto sua amiga usavam hijabs!
“Ele gritou que somos mulheres fracas, cujos maridos as decapitavam em seus países e eles queriam fazer o mesmo aqui no Brasil”, ele aparentemente teve uma reação irada só de vê-las.
Após sua conversão – ou retorno, como ela prefere dizer – ao Islã em 1439 AH (2017 DC), foi a primeira vez que ela foi exposta a uma situação tão perigosa.
“Ele se comportou de forma muito violenta e nos assustou. Desde então, o xeque ou outro irmão nos leva da mesquita até a rodoviária.”
Um estudo publicado recentemente sobre a islamofobia no Brasil – o primeiro na América Latina – relata que casos como o de Souza são bastante comuns entre mulheres muçulmanas no país sul-americano.
A pesquisa, realizada pelo Grupo de Pesquisa Humanitária sobre Comunidades Islâmicas e Árabes, liderado pela antropóloga Francerosi Barbosa, mostrou que 73% das mulheres entrevistadas sofreram algum tipo de agressão nas ruas.
A maioria dos ataques foi verbal, mas 10% disseram ter sido agredidos fisicamente.
As mulheres pobres são mais afligidas
Barbosa, professor do Departamento de Psicologia da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto, que se converteu ao Islã, explicou que o Islã vem crescendo rapidamente no país nos últimos 20 anos.
As novas vagas de imigração provenientes de países islâmicos e o número crescente de recém-chegados ao Islão são as principais razões deste fenómeno. As mulheres ocuparam a maior parte deste número, representando 70% dos novos muçulmanos.
Não existem números confiáveis sobre o tamanho da comunidade muçulmana, mas uma estimativa de fontes não oficiais é que o número não seja inferior a 700 mil pessoas. As famílias de origem árabe constituem a maioria entre eles.
“O Brasil é geralmente visto como um país amigo. “Mas quando se trata do Islão, só é amigável com mulheres que pertencem a uma família muçulmana, que possuem um carro e vivem num bairro seguro.”
Para as mulheres muçulmanas que vivem em bairros pobres e utilizam diariamente o transporte público, os riscos são muito maiores.
“As mulheres que regressam ao Islão são mais desfavorecidas socialmente porque andam de autocarro e comboio e andam nas ruas”, diz Barbosa, acrescentando que muitas destas mulheres são trabalhadoras e de ascendência africana.
Problemas familiares
Barbosa disse que as provações enfrentadas pelas mulheres que se convertem ao Islã no Brasil são múltiplas. Pessoas como Pollyanna D’Souza são prova disso.
“Não é fácil falar sobre isso, mas quando voltei ao Islão, a reacção em casa foi pior do que a reacção nas ruas.”
Ela disse que sua família não sabia nada sobre os muçulmanos “apenas o que a mídia diz sobre eles”.
“Tive que lidar com muitas coisas vergonhosas que me foram ditas. Fiz o meu melhor para não responder e evitar mais problemas.”
O estudo mostrou que 42 por cento daqueles que regressaram ao Islão tiveram de enfrentar a rejeição da sua nova religião por parte das suas famílias.
“Isso está ligado à forma como a imprensa retrata o Islã”, disse Barbosa.
De acordo com o Xeque Ali Abdoun, que dirige o Fórum Mundial da Juventude Muçulmana no Brasil, “há muito tempo que os muçulmanos são vítimas de propaganda enganosa divulgada pela mídia”.
“A desinformação é tão avassaladora que muitas pessoas nem sequer sabem que o Islão é uma religião”, lamentou.
Ali Abdoun confirmou que muitos muçulmanos não-árabes lhe contaram casos de boicote a que foram submetidos entre parentes ou no trabalho. “Eles são definitivamente mais vulneráveis à discriminação”, acrescentou.
Assédio por causa do hijab
A mesquita do Recife é visitada por imigrantes do Senegal, Egito e Paquistão e há muitos convertidos ao Islã. Da Silva faz parte de um grupo de mulheres que se reúne todos os meses para discutir os seus próprios problemas.
“Muitas mulheres sofreram agressões na rua. As pessoas jogam água neles ou os seguem para assustá-los.” Recentemente, um psicólogo visitou a mesquita e conversou com o grupo sobre tal assédio.
83% dos entrevistados responderam que sofreram assédio por causa da sua religião. 32% deles não usam o hijab todos os dias.
Hostilidade com o Islã
Em entrevistas realizadas no ano de 1443 AH (2021 DC), no terceiro ano de mandato do presidente de extrema direita, Jair Bolsonaro. Desde a sua campanha presidencial de 2018 (na qual foi derrotado na sua candidatura à reeleição em novembro e deixará a presidência em 31 de dezembro), ele tem sido um forte aliado dos cristãos evangélicos de direita.
Sua crescente presença social e poder político intensificaram a islamofobia no país, segundo Felipe Freitas de Souza, um dos autores do estudo.
“Uma das consequências de Bolsonaro e seus apoiadores serem membros das tradições ocidentais e judaico-cristãs é que os muçulmanos são definidos como inimigos”, diz Freitas de Souza, doutorando em ciências sociais pela Universidade Estadual Paulista.
Ele ressaltou que houve muitos incidentes de ódio contra os muçulmanos durante a campanha e após a posse de Bolsonaro.
“Em seu quinto dia como novo presidente, Bolsonaro postou um vídeo de uma mulher muçulmana sendo apedrejada, criticando a invasão muçulmana no Ocidente”, lembra Freitas de Souza, que se converteu ao islamismo há 12 anos.
A ascensão do evangelicalismo no Brasil não é novidade. Na verdade, tem havido um crescimento constante no seu número nas últimas décadas. Mas a convergência de muitos dos seus segmentos com a direita é um fenómeno recente que coincide com a adopção de símbolos israelitas por muitas igrejas pentecostais e neopentecostais.
“Agora as bandeiras israelenses podem ser vistas nas sinagogas evangélicas de todo o Brasil”, enfatizou, acrescentando que muitos desses grupos acreditam que a segunda vinda de Cristo pode ser acelerada.
Se o povo judeu recuperasse o controle total sobre a chamada Terra Santa.
Para eles, a questão palestina não tem história, como disse Freitas de Souza, e os palestinos são vistos apenas como inimigos. “Essas ideias se combinam para normalizar a violência e a islamofobia”, disse ele.
A maioria dos muçulmanos no Brasil considera os evangélicos o grupo religioso que mais os discrimina. Para 73% das mulheres muçulmanas entrevistadas, muitas delas enfrentam isso em casa. O estudo apresentou vários relatos de parentes evangélicos insultando convertidos ao Islã.
O problema na sociedade muçulmana
Centro Islâmico de Campinas, uma mesquita localizada em Campinas, Brasil (Wikimedia Commons)
Francis Barbosa e Felipe de Souza confirmaram que a comunidade muçulmana no Brasil não tem cooperado no que diz respeito à proteção das vítimas do ódio, especialmente quando são mulheres que retornam ao Islã.
Barbosa disse: “A maioria dos notáveis muçulmanos no Brasil prefere alertar contra o extremismo religioso!” “Acreditar que islamofobia é um termo muito negativo e que pode piorar as coisas.”
Os pesquisadores entrevistaram 653 muçulmanos. A maioria das pessoas que concordaram em participar eram mulheres.
Para Barbossa, isso é um sinal de que sentem necessidade de denunciar o que passaram.
“A violência traz graves consequências à saúde mental. Muitos deles reclamaram de depressão, tristeza e baixa autoestima. Muitos acabam apostatando.
“Não podemos simplesmente fingir que a islamofobia não existe no Brasil”, concluiu Barbosa.
Este artigo é uma tradução adaptada de um artigo publicado no site middleeasteye.net
Intitulada brasileira, mulher e muçulmana convertida: ‘Tenho medo de usar hijab
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