Os Desafios Enfrentados pela Família Muçulmana Hoje

A família possui uma profundidade de significado em cada nação, servindo como a base da sociedade humana. Enquanto as famílias permanecerem fiéis aos seus princípios inatos, fortalecidas contra tudo que possa minar seus pilares e corromper sua essência, a comunidade prosperará. No entanto, qualquer aflição que recaia sobre a família inflige danos severos tanto ao indivíduo quanto à sociedade, potencialmente conduzindo à devastação e à ruína. Assim, é prudente conceder à família uma atenção contínua e dedicada para preservar sua integridade e protegê-la de quaisquer ameaças. Consequentemente, ela requer fortalecimento, fortificação e resiliência para repelir ataques externos e confrontar os desafios e questões transitórias que a cercam.

Ao falarmos sobre a família, devemos centrar nossa atenção na respeitável família muçulmana, considerando o contexto abrangente atual; lamentavelmente, esse contexto revela um ataque aos valores humanos inatos estabelecidos por Deus Todo-Poderoso como princípio orientador para a humanidade. Essa família se vê navegando em um mar turbulento, cercada pelo caos e enfrentando uma situação complexa que ameaça distorcer, desmantelar e desvalorizar sua essência.

Essa distorção atinge principalmente sua identidade religiosa, seu caráter baseado na fé e a natureza inerente que Deus lhe conferiu. O desmantelamento busca minar sua estrutura social e sua importância dentro da comunidade, promovendo instituições de corrupção e menosprezando seus valores educacionais e seu papel reformador. Todos esses elementos representam desafios e perigos, tanto internos quanto externos, que iremos explorar ao longo deste artigo.

Para abordar este tema, que nem afirmamos abranger plenamente nem possuímos o direito de fazê-lo, destacaremos os aspectos mais significativos, em conformidade com o adágio: “O que não pode ser totalmente alcançado não deve ser completamente abandonado,” mesmo que se trate apenas de uma pequena parte, especialmente em nossa era contemporânea.

Uma das questões primordiais que devemos tratar é a definição e as características da família à qual aspiramos. Em seguida, nos empenharemos em identificar os principais desafios internos e externos, fornecendo, por fim, algumas orientações que acreditamos, contribuirão significativamente para o fortalecimento da família e garantirão sua continuidade no cumprimento das responsabilidades que lhe foram confiadas.

Primeiro: O Conceito da Família Muçulmana: O Modelo que Aspiramos

É amplamente compreendido que a família no Islã possui uma identidade divina e um caráter fundamentado na fé, intimamente ligado aos seus valores, extraindo de sua fonte e orientando-se por seus princípios. Allah estabeleceu a base desse núcleo social através do “vínculo matrimonial,” que Ele transformou em uma vontade realizada, uma tradição firme e um caminho claro para a proliferação da humanidade. Como Ele afirma: “E que Ele criou (tudo) em pares: o masculino e o feminino” (Alcorão, Surah Al-Najm, 45), ,e: “fez dele o casal: o varão e a varoa.” (Alcorão, Surah Al-Qiyamah, 39). Ele também disse: “Ele é Quem vos criou de uma só pessoa e, desta fez sua mulher, para ele tranquilizar-se junto dela.” (Alcorão, Surah Al-A’raf, 189).

A vida desta família só pode prosperar dentro do abraço de sua estrutura legítima e do sistema de valores do qual extrai sua força. Há uma tentativa deliberada de romper sua conexão com essa fundação, despojá-la de sua identidade, tornando-a assim suscetível a invasões e à distorção de sua essência—essência do Islã e de seus valores. Assim, nas últimas décadas, temos testemunhado esforços persistentes para promover ideias desvinculadas deste contexto divino e eterno, até mesmo em oposição a ele. Entre essas estão as crescentes solicitações pela legalização do que é denominado “casamento civil,” em contraste com o “casamento religioso,” além de demandas para sua incorporação nos códigos familiares e nas leis de status pessoal nos países islâmicos.


Esta é uma direção cujas ambições e objetivos são claramente evidentes; busca, por meio deste caminho, minar a própria fundação—ou seja, isolar a família de seu vínculo religioso desde o início, rompendo essa conexão e, assim, abrindo espaço para seu desapego das normas religiosas pertinentes relativas à herança, custódia, linhagem, divórcio e às proibições matrimoniais em alguns casos que nossa religião nos indica. Dessa forma, o caminho é desobstruído para a desestabilização deste sistema de valores interconectados, ameaçando a própria estrutura divina que Deus estabeleceu como um laço sagrado e um pacto solene.

Não devemos negligenciar os esforços coordenados para redefinir o conceito de “família” de maneira a abrir caminho para o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a deviação sexual, a dissolução moral e a ruptura com os instintos naturais, através de uniões como homem com homem, mulher com mulher, homem com sua irmã, pai com filha ou outros parentes próximos, e uma mulher casando-se com múltiplos maridos simultaneamente, como recentemente testemunhado na África do Sul. A mais flagrante degradação se manifesta na união de um ser humano, independentemente de seu gênero, com um animal. Isso nos remete às discussões em torno da adoção da Declaração de Pequim em 1995, que foram acompanhadas de tentativas extenuantes de alterar a natureza da família baseada na fé, sua missão ética e sua estrutura fundamental alicerçada no vínculo sagrado entre um homem e uma mulher, por meio de um contrato legítimo. Tem havido esforços para despojar o casamento de sua significância na lei islâmica e desconectá-lo de seu sistema de valores.

Portanto, devemos retornar para reiterar o conceito da família muçulmana, considerada o núcleo sólido da sociedade e a fortaleza impenetrável que assegura sua coesão, a estabilidade de seu tecido social e cultural, e a continuidade de sua existência; pois a desintegração da família prenuncia a ruína da comunidade.


Consequentemente, o Profeta, que a paz esteja com ele, enfatizou o elemento primordial da estabilidade: “Aquele que acorda em segurança entre vós em seu ninho”, acrescentando a qualificação “seguro em seu ninho”, reforçando assim o conceito mencionado anteriormente.

É talvez digno de nota para o observador contemplativo deste profundo discurso reconhecer a equação fundamental que ele articula, formando uma teoria abrangente de “segurança holística”, que consiste em:

Segurança familiar e societal + segurança da saúde + segurança alimentar = a estabilidade e a felicidade do indivíduo.

Ao revisitarmos os textos fundacionais que tratam especificamente da segurança familiar, descobrimos que os objetivos essenciais da família se manifestam em:

  1. A salvaguarda da honra e da castidade de ambos os cônjuges, preservando sua dignidade.
  2. A proteção e o cuidado da prole, assegurando sua saúde, bem-estar social e estabilidade psicológica.
  3. A perpetuação da espécie humana.
  4. O cultivo da tranquilidade, estabilidade psicológica, afeto e compaixão.
  5. A edificação de uma comunidade humana segura e estável.
  6. A satisfação da necessidade inata de pertencimento familiar.

Qualquer família que careça ou se desvie desses objetivos perde a segurança e a paz, enfrentando desarmonia e sofrimento psicológico em suas relações.

Refletindo sobre a realidade atual da família muçulmana, observa-se uma erosão gradual de sua influência e seu papel central na promoção de uma identidade islâmica robusta, produtiva e ativa. Esse declínio pode ser atribuído a uma notável fraqueza nos fundamentos religiosos, conceituais e educacionais de algumas famílias, juntamente com a falta de consciência cultural familiar. Consequentemente, uma miríade de questões complexas emergiu na sociedade, exacerbadas pela abertura cultural e pela força esmagadora da globalização da mídia. A família muçulmana enfrenta agora rápidas transformações, sofrendo invasões culturais e conceituais em muitos de seus componentes, ao mesmo tempo em que enfrenta sérios desafios que comprometem sua identidade, coesão e estabilidade.

Em segundo lugar: Os Desafios que Enfrenta a Família Muçulmana e os Meios de Fortificação

Existem dois tipos distintos de desafios que confrontam a família muçulmana.

A. Desafios Internos


A família a que nos referimos é aquela reconhecida pelos instintos humanos saudáveis e endossada pelas religiões divinas. Nesse contexto, a “Carta Islâmica Global sobre a Família” (6 de abril de 2016) afirma: “A família é uma unidade social baseada em um homem e uma mulher, unidos por consentimento mútuo por meio de um contrato de casamento legítimo (islâmico) fundado na justiça, benevolência, cooperação, consulta, afeto e compaixão”. Essa definição está fundamentalmente alinhada com o que os pensadores da sabedoria e da razão expressaram ao longo da história.

O Islã dedicou significativa atenção ao estabelecimento da família por meio de um sistema coerente e abrangente de crenças e valores, enraizado na realização de princípios nobres, sendo os mais importantes a justiça, o afeto e a misericórdia, que se destacam em sua essência. Como Allah, o Altíssimo, afirmou: “E, dentre Seus sinais, está que Ele criou para vós, mulheres, de vós mesmos, para vos tranquilizardes junto delas, e fez entre vós afeição e misericórdia. Por certo, há nisso sinais para um povo que reflete.” (Alcorão, Surata Ar-Rum, 21).

O Islã considera a família como o único santuário capaz de promover uma socialização saudável e nutrir relacionamentos interpessoais saudáveis. Consequentemente, os ensinamentos estabelecidos neste domínio criam amplas oportunidades para a realização de numerosos benefícios nas esferas humana, social, educacional, de saúde e econômica, uma vez que a família constitui a essência da existência e continuidade da comunidade.

A família exemplar a que aspiramos é aquela cujos laços foram forjados e cuja estrutura foi erguida pelo amado Profeta Muhammad, que a paz esteja com ele. É a família de “Muhammad e seus parentes”, que as bênçãos e a paz de meu Senhor estejam sobre ele, e que Allah esteja satisfeito com sua família e companheiros juntos.

Esta família é fundada nos princípios do monoteísmo, aproximando-se de Allah por meio de afeto, misericórdia e coexistência harmoniosa, juntamente com todos os valores nobres e significados elevados que promovem segurança e tranquilidade. Como poderia ser de outra forma, quando seu líder é aquele de quem o Senhor da Glória disse: “E, por certo, és de magnífica moralidade.”. (Alcorão, Surata Al-Qalam, 4)? A evidência do Alcorão Sagrado, da Sunnah e da nobre biografia do Profeta é abundante e não pode ser contida com pressa.

Durante a era dos primeiros companheiros do Mensageiro de Allah, que a paz esteja com ele, a família foi estabelecida sobre princípios, fundamentos e componentes essenciais, emulando o Profeta da Orientação e sua família. Entre esses elementos, destacam-se: afeição, misericórdia, serviço, justiça, bondade, tolerância, humildade, equilíbrio entre direitos e responsabilidades, consentimento mútuo e consulta.

Assim, o nobre Profeta, que as bênçãos e a paz do meu Senhor estejam sobre ele, designou a segurança como um aspecto fundamental da felicidade e uma pedra angular da estabilidade, ao proclamar: “Aquele entre vocês que acorda de manhã seguro em seu ninho (lar), saudável em seu corpo e tendo alimento para o dia, é como se o mundo inteiro lhe tivesse sido concedido.” (Sunan At-Tirmidhi, Hadith 2346; Al-Adab Al-Mufrad de Al-Bukhari, Hadith 300). Reconhecendo a importância primordial da segurança, ele a enfatizou como uma prioridade, sublinhando sua necessidade como fundamento sobre o qual tudo mais se edifica e através do qual as necessidades menores são atendidas.

A expressão “segurança do ninho” denota que a conquista da “segurança individual” está condicionada à existência de “segurança social” e vice-versa. Isso se aplica tanto à pequena comunidade – o núcleo familiar do indivíduo e seu primeiro refúgio – quanto à sociedade mais ampla, que serve como extensão natural do indivíduo em seus relacionamentos, interesses e laços. Assim, a segurança da família (o ninho pequeno) é fundamental para a segurança da comunidade e da nação (o ninho maior).


A fraqueza ou a ausência de modelos autênticos, substituídos por figuras falsas e lamentáveis; os conflitos matrimoniais que decorrem principalmente de uma distorção da verdadeira compreensão de conceitos como afeto, misericórdia, harmonia e tutela, entre outros valores essenciais à vida conjugal e familiar; a multiplicidade de intervenientes e suas visões conflitantes, que podem até alcançar o ponto da contradição—por exemplo, uma mãe pode se orgulhar do marido de sua filha, que a mima e satisfaz seus desejos, mas pode sentir descontentamento com o tratamento que seu filho dispensa à esposa.

A transformação de papéis e responsabilidades pode chegar ao ponto de distorção, onde encontramos a esposa assumindo as funções do marido, enquanto ele, devido à pressão da subsistência e suposta necessidade, se vê transformado em algumas de suas funções que só ela pode desempenhar; O desequilíbrio na priorização de demandas e necessidades faz com que luxos e melhorias sejam percebidos como essenciais. Dado que a renda pode ser insuficiente, começa um ciclo de dívidas e empréstimos desnecessários, e estamos bem cientes de que a dívida traz insônia e tormento psicológico à noite e humilhação durante o dia.

B. Desafios Externos

A mídia direcionada, especialmente o conteúdo nas plataformas de redes sociais, tem moldado cada vez mais a vida em geral e a vida familiar especificamente em direção a um modelo consumista e à alienação intelectual e cultural. Mudanças sociais, impulsionadas pelos avanços da vida no contexto da evolução tecnológica e da convergência global, assim como as interações culturais que podem levar alguns a um estado de dissolução, especialmente na transição da convivência familiar estendida para a estrutura da família nuclear (compreendendo o marido, a esposa e seus filhos quando ainda são jovens).

Influências culturais e civilizacionais contrárias à nossa herança; Seu papel na desintegração e distorção das relações familiares introduziu modelos estranhos que divergem de nossas origens culturais e raízes civilizacionais. Esse fenômeno pode ser abordado por meio de perfis culturais e civilizacionais, refletidos em nossas vidas cotidianas (em roupas, culinária, literatura, etc.), bem como em ocasiões religiosas e sociais em que muitos valores nobres foram perdidos na obscuridade.

Em ambas as trajetórias desses desafios, emergem numerosas questões sociais, culturais, econômicas e políticas. Embora este artigo não possa abordar de maneira abrangente todos os problemas e desafios que confrontam a família muçulmana hoje, nosso objetivo é conscientizar sobre essa questão vital e oferecer algumas percepções e sugestões práticas que acreditamos ser essenciais para revitalizar a família muçulmana, restaurando-a ao seu estado e essência naturais, e fortalecendo-a.

Deve-se reconhecer que o papel educativo e social da família diminuiu em muitas sociedades, não apenas nas comunidades muçulmanas. Enquanto isso, a influência da televisão por satélite, da internet e de outros meios de comunicação se expandiu. Muitas famílias começaram a abandonar – se já não o fizeram – suas responsabilidades educativas, tanto morais quanto racionalmente obrigatórias, e começaram a se concentrar cada vez mais em preocupações materiais superficiais e consumistas. Como resultado, as casas tornaram-se meros espaços para comer, beber e dormir, em vez de serem incubadoras de reprodução em várias áreas.

O restabelecimento do equilíbrio educativo e o reforço do papel social e educativo da família estão entre as prioridades mais urgentes que contribuem para a coesão e o progresso da sociedade. Esta missão educativa deve unir todas as instituições sociais, especialmente as organizações educativas, sociais e mediáticas. Além disso, mesquitas e diversos espaços educacionais servem como ambientes vitais que cultivam estruturas acadêmicas e traçam o caminho adequado para a educação comunitária, orientando-a para um envolvimento diligente e construtivo, sem desconsiderar os papéis essenciais desempenhados por toda educação e educação, em particular.

Este artigo foi publicado na segunda edição da revista (Família muculmana)


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