A Sunnah, de acordo com os estudiosos do hadith, é tudo o que foi transmitido do Mensageiro — que a misericórdia e as bênçãos de Deus estejam sobre ele — em relação às suas palavras, ações, aprovações tácitas, personalidade, descrição física ou biografia. Não importa se a informação transmitida se refere a algo antes do início de sua missão profética ou depois dela.
Explicação dessa definição:
As palavras do Profeta incluem tudo o que ele disse por diversos motivos em diferentes ocasiões. Por exemplo, ele disse:
“As ações valem pelas intenções, e cada pessoa terá apenas o que tiver intencionado.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
As ações do Profeta incluem tudo o que ele fez e que foi transmitido por seus Companheiros. Isso inclui como ele fazia as abluções (wudu), como realizava suas orações (salat) e como cumpria a peregrinação (Hajj).
As aprovações tácitas do Profeta incluem tudo o que seus Companheiros disseram ou fizeram e que ele aprovou ou, ao menos, não contestou. Qualquer coisa que tenha recebido a aprovação tácita do Profeta tem a mesma validade do que ele disse ou fez diretamente.
Um exemplo disso é a aprovação dada aos Companheiros quando usaram seu discernimento ao decidir o momento de rezar durante a Batalha de Bani Quraydhah. O Mensageiro de Deus havia dito a eles:
“Nenhum de vocês deve realizar a oração da tarde até que chegue a Bani Quraydhah.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
Os Companheiros não chegaram a Bani Quraydhah até depois do pôr do sol. Alguns deles entenderam literalmente as palavras do Profeta e adiaram a oração da tarde, dizendo: “Não rezaremos até chegarmos lá.” Outros compreenderam que o Profeta apenas queria incentivá-los a se apressarem na viagem, então pararam e rezaram a oração da tarde em seu horário.
O Profeta soube do que os dois grupos haviam decidido, mas não criticou nenhum deles.
Quanto à personalidade do Profeta, isso inclui a seguinte afirmação de Aisha (Radiyallahu ‘anhā):
“O Mensageiro de Deus nunca foi indecente ou vulgar, nem falava alto no mercado. Ele jamais respondia às ofensas dos outros com ofensas próprias. Pelo contrário, era tolerante e perdoador.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari)
A descrição física do Profeta encontra-se em relatos como o transmitido por Anas (Radiyallahu ‘anhu):
“O Mensageiro de Deus não era muito alto nem muito baixo. Não era excessivamente branco nem negro. Seu cabelo não era excessivamente encaracolado nem completamente liso.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
A Relação entre a Sunnah e a Revelação
A Sunnah é uma revelação de Deus a Seu Profeta. Deus diz no Alcorão:
“…E enviamos a ele o Livro e a Sabedoria…”
(Alcorão 2:231, tradução de Dr. Helmi Nasr)
A “Sabedoria” refere-se à Sunnah. O grande jurista al-Shafi‘i disse:
“Deus menciona o Livro, que é o Alcorão. Eu ouvi de pessoas que considero autoridades no Alcorão que a Sabedoria é a Sunnah do Mensageiro de Deus.”
Deus também diz:
“Com efeito, Deus agraciou os crentes, quando lhes enviou um Mensageiro, de entre eles, que lhes recitava os Seus versículos, e os purificava, e lhes ensinava o Livro e a Sabedoria…”
(Alcorão 3:164, tradução de Dr. Helmi Nasr)
Fica claro, a partir desses versículos, que Deus revelou ao Seu Profeta tanto o Alcorão quanto a Sunnah, e ordenou-lhe que transmitisse ambos ao povo.
Os ahadith proféticos também atestam que a Sunnah é revelação. Foi relatado de Mak’hool que o Mensageiro de Deus disse:
“Deus me deu o Alcorão e algo semelhante a ele, da Sabedoria.”
(Hadith autêntico, narrado por Abu Dawud e al-Tirmidhi)
Al-Miqdam ibn Ma‘dee Karib relatou que o Mensageiro de Deus disse:
“Foi-me dado o Livro, e com ele algo semelhante.”
(Hadith autêntico, narrado por Ahmad e Abu Dawud)
Hisan ibn Atiyyah relatou que Gabriel costumava vir ao Profeta com a Sunnah da mesma forma que vinha a ele com o Alcorão.
Uma opinião do Profeta não era meramente seus próprios pensamentos ou reflexões sobre um assunto; era aquilo que Deus lhe revelava. Dessa maneira, o Profeta era diferente das outras pessoas. Ele era apoiado pela revelação. Quando exercia seu próprio raciocínio e estava correto, Deus o confirmava; e, se alguma vez cometesse um erro em seu pensamento, Deus o corrigia e o guiava para a verdade.
Por essa razão, relata-se que o Califa ‘Umar (Radiyallahu ‘anhu) disse do púlpito:
“Ó povo! As opiniões do Mensageiro de Deus eram corretas apenas porque Deus lhe revelava a verdade. Quanto às nossas opiniões, não passam de pensamentos e conjecturas.”
Os dois tipos de revelação recebida pelo Profeta
A revelação que o Profeta recebia era de dois tipos:
A. Revelação informativa:
Deus o informava de algo por meio da revelação em uma de suas formas, como mencionado no seguinte versículo do Alcorão:
“E não é dado a nenhum ser humano que Deus lhe fale senão por revelação, ou por detrás de uma cortina, ou por enviar um Mensageiro que revele, com Sua permissão, o que Ele quer. Por certo, Ele é Altíssimo, Sábio.”
(Alcorão 42:51)
Aisha (Radiyallahu ‘anhā) relatou que al-Harith ibn Hisham perguntou ao Profeta como a revelação lhe chegava, e o Profeta respondeu:
“Às vezes, o anjo vem a mim como o som de um sino, e essa é a forma mais difícil para mim. Pesa sobre mim, e eu retenho o que ele diz. E às vezes o anjo vem a mim na forma de um homem, fala comigo, e eu retenho o que ele diz.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
Aisha disse:
“Eu o vi quando a revelação lhe chegava em um dia extremamente frio, e quando terminava, sua testa estava coberta de suor.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
Às vezes, ele era questionado sobre algo, mas permanecia em silêncio até que a revelação lhe chegasse. Por exemplo, os politeístas de Meca perguntaram a ele sobre a alma, mas o Profeta permaneceu em silêncio até que Deus revelou:
“E perguntam-te acerca do espírito. Dize: ‘O espírito é uma ordem de meu Senhor. E não vos foi concedido do conhecimento senão pouco’.”
(Alcorão 17:85)
Ele também havia sido questionado sobre como a herança deveria ser dividida, mas não respondeu até que Deus revelou:
“Deus vos prescreve, acerca de vossos filhos…”
(Alcorão 4:11)
B. Revelação afirmativa:
Esse tipo ocorria quando o Profeta exercia seu próprio julgamento em uma questão. Se sua opinião estivesse correta, a revelação vinha para confirmá-la; e se estivesse incorreta, a revelação vinha para corrigi-lo — tornando-se, assim, como qualquer outra revelação informativa. A única diferença aqui é que a revelação vinha em resposta a uma ação que o Profeta havia realizado por si mesmo.4:13]
Nessas situações, o Profeta era deixado para usar seu próprio critério em um assunto. Se ele escolhesse o que era correto, então Deus confirmava sua escolha por meio da revelação. Se escolhesse errado, Deus o corrigia para proteger a integridade da fé. Deus nunca permitiria que Seu Mensageiro transmitisse um erro às pessoas, porque isso levaria seus seguidores ao erro também. Isso contrariaria a sabedoria por trás do envio dos Mensageiros, que era de modo que as pessoas não tivessem nenhum argumento contra Deus. Assim, o Mensageiro foi protegido de cair no erro, pois, se alguma vez errasse, a revelação vinha para corrigi-lo.
Os Companheiros do Profeta sabiam que a aprovação tácita do Profeta era, na verdade, a aprovação de Deus, porque, se eles alguma vez fizessem algo contrário ao Islã durante a vida do Profeta, a revelação desceria condenando o que tinham feito.
Jabir disse:
“Nós praticávamos o coitus interruptus [1] quando o Mensageiro de Deus ainda estava vivo.”
Sufyan, um dos narradores deste hadith, comentou:
“Se algo assim fosse proibido, o Alcorão o teria proibido.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
A Sunnah na Lei Islâmica
A Diferença entre a Sunnah e o Alcorão
O Alcorão é a base da Lei Islâmica. É a fala milagrosa de Deus, revelada ao Mensageiro — que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele — por meio do anjo Gabriel. Foi transmitido a nós com tantas cadeias de autoridade que sua autenticidade histórica é indiscutível. Está escrito em seu próprio volume, e sua recitação é uma forma de adoração.
Quanto à Sunnah, ela é tudo o que veio do Mensageiro de Deus além do Alcorão. Explica e fornece detalhes para as leis encontradas no Alcorão. Também fornece exemplos da aplicação prática dessas leis. É também revelação direta de Deus, ou decisões do Mensageiro que foram então confirmadas pela revelação. Portanto, a fonte de toda a Sunnah é a revelação.
O Alcorão é a revelação formalmente recitada como ato de adoração, e a Sunnah é a revelação que não é formalmente recitada. Porém, a Sunnah é como o Alcorão no sentido de que é revelação que deve ser seguida e observada.
O Alcorão tem precedência sobre a Sunnah em dois aspectos. Em primeiro lugar, o Alcorão consiste nas palavras exatas de Deus, milagrosas em sua natureza, até o último versículo. A Sunnah, entretanto, não é necessariamente as palavras exatas de Deus, mas sim seus significados conforme explicados pelo Profeta.
A Posição da Sunnah na Lei Islâmica
Durante a vida do Mensageiro, o Alcorão e a Sunnah eram as únicas fontes da Lei Islâmica.
O Alcorão fornece as injunções gerais que formaram a base da Lei, sem entrar em todos os detalhes e legislações secundárias, com exceção de algumas injunções estabelecidas juntamente com os princípios gerais. Essas injunções não estão sujeitas a mudança ao longo do tempo nem com as circunstâncias mutáveis das pessoas. O Alcorão, igualmente, traz os fundamentos da crença, estabelece os atos de adoração, menciona as histórias das nações antigas e fornece diretrizes morais.
A Sunnah está em concordância com o Alcorão. Explica os significados do que é obscuro no texto, fornece detalhes do que é mencionado em termos gerais, especifica o que é geral e explica suas injunções e objetivos. A Sunnah também traz injunções que não são fornecidas pelo Alcorão, mas estas estão sempre em harmonia com seus princípios e sempre promovem os objetivos delineados no Alcorão.
A Sunnah é a expressão prática do que está no Alcorão. Essa expressão assume muitas formas: às vezes é uma ação realizada pelo Mensageiro, outras vezes é uma declaração feita em resposta a algo. Às vezes, assume a forma de uma declaração ou ação de um dos Companheiros que ele nem impediu nem objetou. Pelo contrário, permaneceu em silêncio ou expressou sua aprovação.
A Sunnah explica e esclarece o Alcorão de muitas maneiras. Explica como realizar os atos de adoração e cumprir as leis mencionadas no Alcorão. Deus ordena aos crentes que rezem, sem mencionar os horários ou a forma de realizá-las. O Mensageiro esclareceu isso por meio de suas próprias orações e ensinando os muçulmanos como orar. Ele disse:
“Orai como me vistes orando.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari)
Deus tornou obrigatória a peregrinação do Hajj sem explicar seus ritos. O Mensageiro de Deus esclareceu isso dizendo:
“Tomai de mim os ritos do Hajj.”
(Hadith autêntico, narrado por Muslim)
Deus tornou obrigatória a Zakah sem mencionar sobre quais tipos de riqueza e produtos ela deve ser aplicada. Deus também não menciona o montante mínimo que torna a taxação obrigatória. A Sunnah, porém, esclarece tudo isso.
A Sunnah especifica declarações gerais encontradas no Alcorão. Deus diz:
“Deus vos prescreve, acerca de vossos filhos: ao homem, parte igual à de duas mulheres…”
(Alcorão 4:11)
Essa formulação é geral, aplicando-se a todas as famílias e tornando cada filho herdeiro de seus pais. A Sunnah torna essa regra mais específica, excluindo os filhos dos Profetas. O Mensageiro de Deus disse:
“Nós, Profetas, não deixamos herança. O que deixamos para trás é caridade.”
(Hadith autêntico, narrado por al-Bukhari e Muslim)
A Sunnah qualifica declarações não qualificadas no Alcorão. Deus diz:
“…e não encontrardes água, então fazei tayammum (ablução seca) com terra limpa e esfregai com ela vossos rostos e mãos…”
(Alcorão 5:6)
O versículo não menciona a extensão da mão, deixando a questão se se deve esfregar as mãos até o pulso ou até o antebraço. A Sunnah esclarece isso mostrando que é até o pulso, porque foi assim que o Mensageiro de Deus realizou a ablução seca.
A Sunnah também enfatiza o que está no Alcorão ou fornece legislação secundária para uma lei nele estabelecida. Isso inclui todos os hadith que indicam que a oração, a Zakah, o jejum e o Hajj são obrigatórios.
Um exemplo de onde a Sunnah fornece legislação subsidiária é a proibição encontrada nela de vender frutas antes que comecem a amadurecer. A base para essa lei é a declaração do Alcorão:
“E não consumais, entre vós, vossas riquezas injustamente, exceto se for um comércio de mútuo consentimento entre vós.”
(Alcorão 4:29)
A Sunnah contém regras que não são mencionadas no Alcorão e que não vêm como explicações para algo mencionado no Alcorão. Um exemplo é a proibição de comer carne de jumento e carne de animais predadores. Outro exemplo é a proibição de casar com uma mulher e sua tia ao mesmo tempo. Essas e outras regras fornecidas pela Sunnah devem ser obedecidas.
A Obrigação de Seguir a Sunnah
Um requisito da crença na profecia é aceitar como verdade tudo o que o Mensageiro de Deus disse. Deus escolheu Seus Mensageiros de entre Seus servos para transmitir Sua Lei à humanidade. Deus diz:
“…Deus sabe melhor com quem confiar Sua Mensagem…”
(Alcorão 6:124)
Deus também diz:
“…Acaso os Mensageiros são incumbidos de algo senão de transmitir claramente a Mensagem?”
(Alcorão 16:35)
O Mensageiro é protegido do erro em todas as suas ações. Deus protegeu sua língua de proferir algo além da verdade. Deus protegeu seus membros de fazer algo além do que é correto.
Deus o salvaguardou de aprovar algo contrário à Lei Islâmica. Ele é a mais bela perfeição das Criações de Deus. Isso é claro na forma como Deus o descreve no Alcorão:
“Pelo astro quando se põe. Vosso companheiro não se extraviou nem se equivocou. Nem fala de sua própria inclinação. Não é senão revelação revelada.”
(Alcorão 53:1-4)
Vemos no hadith que nenhuma circunstância, por mais difícil, poderia impedir o Profeta de falar a verdade. A raiva nunca afetou seu discurso. Ele nunca falou falsidade, mesmo quando brincava. Seus próprios interesses nunca o desviaram de falar a verdade. O único objetivo que buscava era o agrado de Deus Todo-Poderoso.
‘Abdullah ibn ‘Amr ibn al-‘As relatou que costumava escrever tudo o que o Mensageiro de Deus dizia. Então, a tribo de Quraish o proibiu de fazer isso, dizendo:
“Tu escreves tudo o que o Mensageiro de Deus diz, mas ele é apenas um homem que fala quando está satisfeito ou quando está zangado?”
‘Abdullah ibn ‘Amr parou de escrever e mencionou isso ao Mensageiro de Deus, que lhe disse:
“Escreve! Pois, por Aquele em cuja mão está minha alma, nada além da verdade sai desta boca.” …e apontou para sua boca.
(Hadith autêntico, narrado por Abu Dawud e Ahmad)
O Alcorão, a Sunnah e o consenso dos juristas apontam para o fato de que obedecer ao Mensageiro de Deus é obrigatório. Deus diz no Alcorão:
“Ó vós que credes! Obedecei a Deus e obedecei ao Mensageiro e àqueles de vós investidos da autoridade. E se disputardes sobre algo, levai-o a Deus e ao Mensageiro, se credes em Deus e no Derradeiro Dia…”
(Alcorão 4:59)
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[1] Coitus Interruptus: Retirada do pênis antes da emissão do esperma durante o ato sexual. – IslamReligion.com


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