Refutação da atribuição dos Evangelhos e Epístolas aos apóstolos

Os 27 livros do Novo Testamento são atribuídos a oito autores, com extensões variadas em seus escritos: enquanto a epístola de Judas, o discípulo, não ultrapassa duas páginas, Paulo escreveu mais de cem páginas.

Além disso, há diferenças quanto à proximidade desses autores em relação a Cristo: Mateus, João, Pedro, Judas e Tiago foram de seus doze discípulos; já Lucas e Marcos nunca conheceram Jesus pessoalmente, enquanto Paulo só se converteu após a elevação de Cristo.

Os cristãos consideram esses oito autores como homens inspirados, que escreveram sob a orientação do Espírito Santo, cada um com seu próprio estilo. Contudo, já demonstramos anteriormente que os autores do Novo Testamento não foram inspirados.

Mas será que é correta a atribuição desses livros a esses oito autores? Especialmente a Mateus, João e Pedro, que supostamente estavam entre os discípulos mais próximos de Cristo? Ou será que tal atribuição também é uma falsificação? E seria possível que tais escritos – encontrados no Novo Testamento – viessem realmente dos apóstolos de Cristo, que foram educados por ele durante os anos de sua missão e que o Alcorão menciona com elogio?

A análise dos pesquisadores sobre os escritos do Novo Testamento levou-os a concluir que esses textos não poderiam ter origem nos discípulos fiéis de Cristo. Por isso, dedicaram-se ao estudo e à verificação da autoria dessas obras.

Não nos deteremos muito na análise da atribuição de alguns livros, pois seus autores não foram discípulos de Cristo. Assim, pouco importa se os autores dos evangelhos de Marcos e Lucas foram de fato Marcos e Lucas, ou qualquer outro cristão do final do primeiro século. Nenhum deles era infalível, nem inspirado, nem recebeu sequer um elogio de Cristo, a paz esteja com ele. O mesmo se aplica às epístolas de Paulo – inimigo de Cristo, que reivindicou para si a missão e a infalibilidade, apesar de nunca ter encontrado Jesus pessoalmente.

Primeiro: O Evangelho de Mateus

Este é o primeiro evangelho que o leitor encontra ao abrir a Bíblia. Ele contém vinte e oito capítulos que narram a vida de Cristo e seus ensinamentos, desde o nascimento até a ascensão aos céus.

A Igreja atribui este evangelho ao apóstolo Mateus, um dos doze discípulos escolhidos por Cristo, alegando que o livro teria sido inspirado pelo Espírito Santo. As fontes sugerem que Mateus escreveu seu evangelho para os habitantes da Palestina, isto é, para os judeus convertidos ao cristianismo. Contudo, as opiniões divergem bastante quanto à data de sua redação, embora haja certa concordância de que tenha sido escrito entre os anos 37 e 100 d.C.

A introdução do evangelho, na versão da Edição Jesuíta, afirma: “Muitos autores situam a redação do primeiro evangelho entre os anos 80 e 90, talvez um pouco antes; mas não é possível alcançar certeza absoluta quanto a isso.”

O comentador do evangelho, Fenton (p. 11), sugere que ele foi escrito aproximadamente entre os anos 85 e 105 d.C., opinião semelhante à do professor Haring, que afirmou: “O Evangelho de Mateus foi composto entre os anos 80 e 100 d.C.”.

Quanto ao idioma em que foi redigido, os Pais da Igreja – seguindo a opinião do bispo Papias – tendem a considerar que foi escrito em hebraico, enquanto muitos pesquisadores modernos defendem que foi escrito em grego.

Talvez o testemunho histórico mais relevante sobre este evangelho seja o do bispo Papias de Hierápolis (155 d.C.), que disse: “Mateus escreveu os ditos em hebraico, e cada um os traduziu para o grego conforme sua capacidade.” Já Irineu, bispo de Lyon (200 d.C.), declarou em seu livro Contra as Heresias que Mateus compôs um evangelho para os hebreus, escrito em sua própria língua ..

E como todos os manuscritos existentes do Evangelho estão em grego, os pesquisadores levantaram a questão sobre quem teria traduzido o original hebraico para o grego. A esse respeito, há muitas opiniões sem qualquer prova, que são — como afirma o padre Matta El-Meskeen — “suposições não apoiadas por nenhuma evidência”. Uns disseram que o próprio Mateus foi o tradutor, outros afirmaram que foi João, o evangelista, e outros atribuíram a diferentes pessoas.

O correto é o que disse São Jerônimo (420 d.C.): “Aquele que traduziu Mateus do hebraico para o grego é desconhecido”. Aliás, talvez o tradutor tenha sido mais de um, como disse Papias.

Norton, conhecido como o “Defensor do Evangelho”, disse sobre o trabalho desse tradutor desconhecido: “O tradutor de Mateus foi como um lenhador de noite, que não distinguia entre o verde e o seco. Assim, tanto o que havia de correto como de errado no texto, ele traduziu”.

A identidade de Mateus

Quem foi Mateus? Qual sua relação com o evangelho que leva seu nome? E esse evangelho contém de fato a Palavra e a revelação de Deus?

Para responder a essas questões, os pesquisadores transmitiram o que foi mencionado pelos estudiosos cristãos sobre Mateus. Ele foi um dos doze discípulos, trabalhava como cobrador de impostos em Cafarnaum e seguiu a Cristo posteriormente.

As fontes históricas relatam que ele viajou para a Etiópia e foi morto lá no ano 70 d.C. No Novo Testamento, seu nome aparece apenas duas vezes: a primeira, quando Cristo o chamou enquanto estava no local da coleta de impostos (cf. Mateus 10:3), e a segunda, na enumeração dos nomes dos doze discípulos (cf. Mateus 10:3; Lucas 6:15).

Vale destacar que Marcos e Lucas mencionam que o cobrador de impostos encontrado por Cristo no posto de arrecadação chamava-se Levi, filho de Alfeu (cf. Marcos 2:15; Lucas 5:27), sem fazer referência a Mateus. A Igreja, sem apresentar provas, alega que Levi, filho de Alfeu, seria apenas outro nome de Mateus, o cobrador de impostos.

John Fenton, comentarista do Evangelho de Mateus e decano da Faculdade de Teologia de Linchfield, afirma que não há evidência de que Mateus seja simplesmente o “nome cristão” de Levi. Ele sugere que é possível que houvesse alguma ligação entre Mateus, o discípulo, e a comunidade cristã para a qual o evangelho foi escrito. Assim, o autor do evangelho pode ter atribuído sua obra ao fundador dessa igreja ou ao seu mestre chamado Mateus. Fenton acrescenta que provavelmente o evangelista aproveitou a oportunidade oferecida por Marcos ao narrar o chamado de um discípulo, associando-o a esse discípulo específico (Mateus), um dos doze, que era venerado como apóstolo da comunidade à qual o evangelista pertencia.


As provas apresentadas pela Igreja para a autoria de Mateus

A Igreja insiste que Mateus é o autor do evangelho e se apoia em alguns argumentos listados pelos editores do Dicionário da Bíblia. Entre eles:

“As evidências claras no estilo de escrita demonstram que o autor era um judeu convertido ao cristianismo.”

“Não é razoável que um evangelho tão importante – colocado em primeiro lugar entre os evangelhos – fosse atribuído a uma pessoa desconhecida; era mais lógico vinculá-lo a um dos discípulos de Cristo.”

“Papias, no século II, afirmou que Mateus reuniu os ditos de Cristo.”

“É fato conhecido que os cobradores de impostos tinham o hábito de manter registros detalhados, já que essa era uma de suas principais funções administrativas. Assim também o evangelista teria registrado cuidadosamente as palavras de Cristo.”

Observações sobre o Evangelho de Mateus

A partir da análise anterior, os pesquisadores concluíram que não existe prova real, no cristianismo, que confirme a atribuição do evangelho a Mateus. Não é porque um cobrador de impostos registrava informações administrativas em seu trabalho que, necessariamente, teria feito registros fidedignos de natureza religiosa. Além disso, o simples fato de Mateus ter escrito algumas palavras de Cristo não garante a autenticidade do evangelho que hoje leva seu nome.

Na realidade, há fortes evidências de que o autor desse evangelho não foi um discípulo de Cristo. O próprio texto apresenta vários elementos que indicam que o escritor não poderia ter sido Mateus, o apóstolo. Entre eles:

Dependência do Evangelho de Marcos:
Mateus reproduziu cerca de 600 das 612 passagens de Marcos e ainda utilizou um documento adicional que os estudiosos chamam de Q.

J. B. Phillips, professor de teologia na Igreja da Inglaterra, afirma em sua introdução ao Evangelho de Mateus: “São Mateus citava o Evangelho de São Marcos, revisando-o na tentativa de chegar a uma concepção mais adequada e elevada de Deus.”

O reverendo Fahim Aziz, em Introdução ao Evangelho, acrescenta que a dependência de Mateus em relação a Marcos é um fato reconhecido por todos os estudiosos. Mas, se Mateus, o discípulo, fosse realmente o autor do evangelho, como poderia ter copiado Marcos – que tinha apenas dez anos de idade na época da missão de Cristo? Como poderia um dos doze discípulos, testemunha ocular, citar alguém que nem sequer presenciou os acontecimentos?

Referência a si mesmo na terceira pessoa:


O Evangelho de Mateus menciona o cobrador de impostos chamado Mateus em duas ocasiões, sem indicar em momento algum que ele seria o autor do livro. Seu nome aparece apenas na lista dos doze discípulos, nem em primeiro nem em último lugar. E ao narrar seu chamado, o texto usa a terceira pessoa: “Ao passar por ali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria, e disse-lhe: ‘Segue-me’. Ele se levantou e o seguiu” (Mateus 9:9).

Se Mateus fosse o autor, teria escrito: “Jesus me disse”, “eu o segui”, “ele me viu”. Esse detalhe sugere fortemente que o autor não foi Mateus.

Conhecimento profundo das Escrituras judaicas:

O evangelho demonstra vasta erudição em relação ao Antigo Testamento, tornando-o o mais preocupado entre os evangelistas em relacionar profecias judaicas a Cristo. Isso dificilmente poderia vir de um cobrador de impostos sem formação religiosa.

A. Tricot, em seu comentário sobre o Novo Testamento (1960), afirmou: “A crença de que Mateus era um cobrador de impostos em Cafarnaum, chamado por Jesus para aprender com ele, já não é aceitável, em contraste com o que afirmam os Pais da Igreja.”

Negadores da autoria do Evangelho atribuída ao discípulo Mateus

Muitos estudiosos do cristianismo, antigos e modernos, negaram a autenticidade da atribuição do evangelho a Mateus, assim como outros antes deles. Entre esses está o maniqueísta Fausto, no século IV, que declarou: “O evangelho atribuído a Mateus não é de sua autoria.”

O mesmo afirmou São Willms e também o padre Didon em sua obra A Vida de Cristo.

J. B. Phillips, em sua introdução ao Evangelho de Mateus, diz: “A tradição antiga atribuiu esta boa-nova ao apóstolo Mateus, mas a maioria dos estudiosos de hoje rejeita essa opinião.”

O professor Harnack acrescenta: “O Evangelho de Mateus não é obra do apóstolo Mateus, mas de um autor desconhecido que ocultou sua identidade por algum motivo.”

Na introdução da edição da Bíblia da Escola Bíblica de Jerusalém (edição jesuíta), lê-se:

“Quanto ao autor, o evangelho nada diz. A tradição eclesiástica mais antiga (Papias, bispo de Hierápolis, na primeira metade do século II) atribui-o ao apóstolo Mateus… mas o estudo do evangelho não confirma nem invalida essa opinião de forma decisiva. Como não sabemos ao certo o nome do autor, convém limitar-nos a algumas características esboçadas no próprio evangelho…”

O reverendo Fahim Aziz, em Introdução ao Evangelho, afirma sobre o autor desconhecido de Mateus: “Não podemos lhe dar um nome. Pode ter sido o apóstolo Mateus, mas pode ter sido outro.”

O comentarista John Fenton, em sua Exegese do Evangelho de Mateus (p. 136), declara: “Vincular a autoria deste evangelho ao discípulo Mateus é, sem dúvida, pura imaginação.”

Além disso, algumas seitas cristãs antigas também contestaram a autenticidade do evangelho ou de partes dele. Os ebionitas consideravam os dois primeiros capítulos do Evangelho de Mateus como acréscimos posteriores. O mesmo pensavam os unitarianos, que entendiam que o verdadeiro início do evangelho se dava em: “Naqueles dias apareceu João Batista…” (Mateus 3:1). Assim, a narrativa começaria com João Batista, do mesmo modo que em Marcos e João.

Esse ponto de vista é reforçado pelo fato de que a expressão “Naqueles dias” não se conecta logicamente com os capítulos anteriores. O capítulo 2 termina com a matança dos inocentes ordenada por Herodes após o nascimento de Cristo — época em que Jesus e João ainda eram crianças, sendo João apenas seis meses mais velho. Já o capítulo 3 fala do chamado de João Batista, quando já era adulto. Isso indica que houve uma lacuna ou omissão antes do capítulo 3, ou então que ele constitui o verdadeiro início do evangelho.


Quem é o verdadeiro autor do Evangelho de Mateus?

E se não foi Mateus o autor do evangelho que lhe é atribuído, então quem escreveu esse evangelho?

Para responder à questão, podemos dizer que os estudos ocidentais confirmaram que este evangelho foi escrito por alguém que não o discípulo Mateus, mas que foi atribuído a ele desde o século II, e talvez o autor tenha sido um discípulo da escola de Mateus.

Coleman e os comentaristas da Tradução Ecumênica tentam identificar alguns traços desse escritor. Pelo que aparece em seu evangelho, ele era um cristão judeu que relacionava a Torá com a vida de Cristo. Coleman o descreve como alguém que corta os laços que o prendem ao judaísmo, mas, ao mesmo tempo, se esforça para manter a linha do Antigo Testamento. Era, portanto, um escritor judeu que respeitava a Lei, e por isso se distanciava da escola de Paulo, que não respeitava a Lei. Esse autor, ao contrário, afirma:
“Aquele, pois, que violar um destes mandamentos, ainda que dos menores, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no Reino dos Céus” (Mateus 5:19).

Outro ponto que confirma que Mateus não foi o autor desse evangelho é que muitos comentaristas e pesquisadores consideram – como já foi mencionado – que o evangelho foi escrito depois do ano 70 d.C., data em que Mateus já havia falecido.

Se perguntarmos: onde está o evangelho escrito por Mateus, conforme testemunho de Papias no século II?

A resposta é que Papias mencionou que Mateus escreveu e reuniu os ditos de Cristo. O que encontramos no evangelho atual é uma narrativa completa da vida de Cristo, e não apenas uma coleção de suas palavras. Além disso, o fato de este evangelho não ser de autoria de Mateus não impede a possibilidade de que tenha existido outro evangelho escrito por ele. Importa lembrar que, entre os evangelhos rejeitados pela Igreja, havia um chamado Evangelho de Mateus; talvez fosse a esse que Papias se referia.

Algo próximo a essa conclusão foi alcançado pelo erudito Maier, que afirmou em sua pesquisa que o que Mateus escreveu foram os ditos de Cristo, os quais foram posteriormente traduzidos para o grego e organizados de acordo com o esquema histórico que temos hoje.

Assim, os estudiosos chegaram à conclusão de que há vários fatores que impedem considerar este evangelho como sendo a Palavra de Deus e sua revelação. Como diz o sheikh Abu Zahra, trata-se de um evangelho “de autoria desconhecida, com divergências sobre a data de sua redação, a língua em que foi escrito, o lugar de origem, o público a quem foi dirigido, bem como a identidade e a condição do tradutor – se era piedoso ou não, se tinha conhecimento da religião, e das duas línguas de onde e para onde traduziu. Tudo isso leva à perda de elos fundamentais na investigação científica”.


Segundo: O Evangelho de Marcos

O segundo evangelho que encontramos no Novo Testamento é atribuído a Marcos. Mas quem foi Marcos? O que sabemos sobre o autor deste evangelho? E será que a sua atribuição a ele é correta?

O Evangelho de Marcos é composto por dezesseis capítulos, narrando a história de Cristo desde o seu batismo por João Batista até a sua ressurreição após a crucificação.

É o mais curto dos evangelhos – e, como afirma Weiss, considerado pelos críticos o mais autêntico relato da vida de Cristo. Há quase consenso entre os estudiosos de que foi o primeiro evangelho a ser escrito, e que Mateus e Lucas se basearam nele.

Os autores de Introdução à Bíblia afirmam:

“Talvez o Evangelho de Marcos tenha sido a mais antiga das quatro boas-novas, escrita entre os anos 65 e 70 d.C., antes da destruição do Templo de Jerusalém. Parece que tanto Mateus quanto Lucas utilizaram o Evangelho de Marcos” .

O estudioso alemão Reuss sustenta que Marcos foi a fonte de onde Mateus e Lucas extraíram material. Este evangelho é também o único entre os quatro que começa explicitamente com a designação Evangelho de Cristo, pois o primeiro versículo afirma: “Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Marcos 1:1) .

As fontes cristãs afirmam que Marcos escreveu seu evangelho em Roma, ou talvez em Alexandria, entre os anos 39 e 75 d.C., sendo mais aceito que tenha sido entre 44 e 75 d.C., baseando-se no testemunho do historiador Irineu, que disse:


“Marcos escreveu o evangelho após a morte de Pedro e Paulo.”

Já o crítico judeu Spinoza argumenta que este evangelho foi escrito duas vezes: uma antes do ano 180 d.C. e outra depois.

Quanto à língua em que foi escrito, as fontes concordam que foi o grego.

A referência mais antiga a este evangelho vem do historiador Papias (c. 140 d.C.), que disse:
“Marcos compôs o seu evangelho a partir das memórias que lhe foram transmitidas por Pedro.”

Quem é Marcos?

Os estudiosos transmitiram o que as fontes cristãs mencionaram sobre Marcos em suas biografias, e tudo isso pode ser resumido no que consta no Dicionário da Bíblia a seu respeito: ele é chamado Marcos, e seu nome é João. Marcos acompanhou Barnabé e Paulo em sua viagem, depois os deixou, e mais tarde voltou a acompanhar Paulo.

Os tradutores concordam que ele foi intérprete de Pedro, que tinha ligação com este Evangelho.

O historiador Eusébio menciona que — ou seja, Marcos — foi o primeiro a proclamar a mensagem do Evangelho em Alexandria, e que lá foi morto.

Pedro Qormaj disse em seu livro Prados das Notícias nas Biografias dos Justos sobre Marcos: “Ele negava a divindade de Cristo”.


Observações sobre o Evangelho de Marcos

Os estudiosos examinaram atentamente este evangelho e seu autor, levantando várias observações:

Marcos não foi discípulo de Jesus, mas discípulo de Paulo e Pedro. O comentarista Dennis Nineham, em sua Comentário sobre o Evangelho de Marcos (p. 39), afirma:
“Não existiu ninguém com esse nome que fosse conhecido por ter uma relação estreita e especial com Jesus, ou que tivesse notoriedade particular na igreja primitiva.”

Há uma forte evidência nesse sentido na declaração do historiador eclesiástico Papias (140 d.C.), que disse:

“O ancião João costumava dizer: quando Marcos se tornou intérprete de Pedro, registrou cuidadosamente tudo o que se lembrava. Contudo, não o fez em ordem exata, pois ele não ouvira o Senhor, nem o acompanhara, mas, como disse, apenas seguiu a Pedro, que adaptava os ensinamentos de Jesus às necessidades dos ouvintes, não apresentando, assim, um relato estritamente fiel das palavras e obras de Jesus.”

Dennis Nineham acrescenta (p. 39):

“Não é certo que o dito tradicional, que identifica Marcos como autor do evangelho, se refira ao João Marcos mencionado em Atos dos Apóstolos (12:12, 25)… ou ao Marcos mencionado em 1 Pedro (5:13)… ou ainda ao Marcos citado nas cartas de Paulo.

A igreja primitiva tinha o hábito de considerar que todos os eventos ligados a um nome mencionado no Novo Testamento pertenciam a uma só pessoa com esse nome. Mas, quando lembramos que o nome Marcos era um dos mais comuns entre os nomes latinos no Império Romano, percebemos o quanto é incerto identificar a pessoa correta nesse caso.”


O problema da conclusão do Evangelho de Marcos

O ponto que mais ocupou os estudiosos foi o final do evangelho. O desfecho (Marcos 16:9-20) não existe nos manuscritos antigos mais importantes, como o Vaticano e o Sinaítico.

William Barclay afirma que, além de faltar nos manuscritos antigos, o estilo linguístico dessa conclusão é diferente do restante do evangelho.

Rahmatullah al-Hindi cita que Jerônimo, no século V, relatou que os primeiros padres da Igreja duvidavam dessa conclusão.

A Versão Padrão Revisada (RSV), em inglês, considerou esses versículos como não autênticos e os removeu de sua edição publicada em 1951.

Já a introdução ao evangelho na edição da Bíblia da Companhia de Jesus diz:
“É geralmente aceito que a conclusão, como está agora (16:9-20), foi adicionada para suavizar a interrupção abrupta no versículo 8.”

Sobre essa conclusão, o padre Kessinger comenta:

“Deve ter havido uma omissão dos versículos finais quando o Evangelho de Marcos foi recebido oficialmente (publicado para o público) na comunidade que o preservou.
Depois que circularam os escritos semelhantes de Mateus, Lucas e João, foi composta uma conclusão respeitável para Marcos, reunindo elementos daqui e dali dos outros evangelistas… Isso mostra a liberdade com que os evangelhos eram tratados.”

E Maurice Bucaille comenta:
“Que confissão clara da existência de alterações feitas pelos homens nos textos sagrados!”.



Terceiro: O Evangelho de Lucas

É o terceiro dos evangelhos e o mais extenso. Compõe-se de vinte e quatro capítulos: os dois primeiros falam sobre o profeta João (o Batista) e o nascimento de Cristo, enquanto os demais capítulos completam a narrativa da vida de Cristo até a ressurreição após a crucificação.

Quanto à redação deste evangelho, as fontes divergem em datá-la entre os anos 53 e 80 d.C. O autor baseou-se em Marcos, copiando dele trezentos e cinquenta trechos de um total de seiscentos e sessenta e um, além de ter se apoiado em Mateus ou em outra fonte comum a ele e Mateus.

Quem é Lucas?

A Igreja atribui este evangelho a São Lucas. As fontes cristãs não relatam muito sobre sua biografia, mas concordam que ele não foi discípulo de Cristo, como fica claro em sua introdução, na qual declara:
“Visto que muitos empreenderam compor uma história dos fatos que se cumpriram entre nós, conforme no-los transmitiram os que desde o princípio foram testemunhas oculares e ministros da palavra” (Lucas 1:1-2).

As fontes também concordam que ele não era judeu e que foi companheiro de Paulo, mencionado em Colossenses 4:14 e em outros lugares, e que escreveu seu evangelho em benefício de seu amigo Teófilo:
“Também a ti, excelentíssimo Teófilo, escrevi de modo ordenado, para que tenhas plena certeza das verdades que aprendeste” (Lucas 1:3-4).

As fontes divergem quanto à identidade de Teófilo: alguns dizem que era um alto funcionário romano; outros, que era grego; e outros ainda, que era egípcio de Alexandria. Mas quase todas concordam que a ele foi escrito em grego.

Quanto a Lucas, alguns dizem que era romano, outros que era de Antioquia, e há ainda outras versões.

Sobre sua profissão, alguns afirmam que foi médico; outros, que foi pintor. Mas, de qualquer forma, era um homem culto e habilidoso escritor de narrativas.

(19) Cf.: Al-Masih fi Masadir al-‘Aqa’id al-Masihiyya, Ahmad ‘Abd al-Wahhab, pp. 64-65, 150; A Bíblia, o Corão e a Ciência, Maurice Bucaille, pp. 87-90.
(20) Cf.: Dicionário da Bíblia, p. 822; Al-Masih fi Masadir al-‘Aqa’id al-Masihiyya, Ahmad ‘Abd al-Wahhab, pp. 64-65.


Observações sobre o Evangelho de Lucas

Os estudiosos apontam algumas observações sobre o Evangelho de Lucas, sendo as principais:

1 – Sua introdução apresenta o caráter de uma carta pessoal, baseada em seu próprio esforço e não em inspiração divina. Isso também foi notado por vários críticos cristãos que negaram a inspiração deste evangelho, entre eles Mr. Kidle em seu livro The Inspiration of the Scriptures, assim como Watson, que atribuiu essa opinião a antigos estudiosos. Santo Agostinho disse: “Eu não acreditaria no Evangelho se não fosse a Igreja Santa que mo entregasse.”

2 – Muitos pesquisadores duvidaram dos dois primeiros capítulos deste evangelho. Como mencionou Jerônimo, essa dúvida remonta até mesmo aos primeiros padres da Igreja, além da seita marcionita, cuja versão não continha esses dois capítulos.

Os estudiosos confirmam que Lucas não escreveu esses capítulos, pois em Atos dos Apóstolos ele diz:
“Fiz o primeiro tratado, ó Teófilo, acerca de tudo que Jesus começou a fazer e a ensinar” (Atos 1:1), isto é, sobre seus milagres, como mostra a continuação:
“até ao dia em que foi elevado” (Atos 1:2).
Ora, os dois primeiros capítulos tratam apenas do nascimento de Cristo, e não de suas obras.

O estudioso católico Thomas Ward relatou em seu livro Errata to the Protestant Bible que Jerônimo mencionou que alguns dos primeiros eruditos também duvidavam do capítulo 22 deste evangelho.

Assim, vemos que este evangelho teria quatro autores que se revezaram na redação de seus trechos e capítulos.

3 – Há obscuridade em torno da sua pessoa: não se sabe com certeza sua terra natal, nem sua profissão, nem o público-alvo de seu evangelho, nem mesmo a data exata da redação. O que se sabe é apenas que foi discípulo de Paulo e que nunca encontrou Cristo. Então, como é possível aceitar como prova um autor em tais condições e considerar sagrado o que escreveu?

Observações sobre o Evangelho de Lucas

Os estudiosos apontam algumas observações sobre o Evangelho de Lucas, sendo as principais:

1 – Sua introdução apresenta o caráter de uma carta pessoal, baseada em seu próprio esforço e não em inspiração divina. Isso também foi notado por vários críticos cristãos que negaram a inspiração deste evangelho, entre eles Mr. Kidle em seu livro The Inspiration of the Scriptures, assim como Watson, que atribuiu essa opinião a antigos estudiosos. Santo Agostinho disse: “Eu não acreditaria no Evangelho se não fosse a Igreja Santa que mo entregasse.”

2 – Muitos pesquisadores duvidaram dos dois primeiros capítulos deste evangelho. Como mencionou Jerônimo, essa dúvida remonta até mesmo aos primeiros padres da Igreja, além da seita marcionita, cuja versão não continha esses dois capítulos.

Os estudiosos confirmam que Lucas não escreveu esses capítulos, pois em Atos dos Apóstolos ele diz:
“Fiz o primeiro tratado, ó Teófilo, acerca de tudo que Jesus começou a fazer e a ensinar” (Atos 1:1), isto é, sobre seus milagres, como mostra a continuação:
“até ao dia em que foi elevado” (Atos 1:2).
Ora, os dois primeiros capítulos tratam apenas do nascimento de Cristo, e não de suas obras.

O estudioso católico Thomas Ward relatou em seu livro Errata to the Protestant Bible que Jerônimo mencionou que alguns dos primeiros eruditos também duvidavam do capítulo 22 deste evangelho.

Assim, vemos que este evangelho teria quatro autores que se revezaram na redação de seus trechos e capítulos.

3 – Há obscuridade em torno da sua pessoa: não se sabe com certeza sua terra natal, nem sua profissão, nem o público-alvo de seu evangelho, nem mesmo a data exata da redação. O que se sabe é apenas que foi discípulo de Paulo e que nunca encontrou Cristo. Então, como é possível aceitar como prova um autor em tais condições e considerar sagrado o que escreveu?

Quarto: O Evangelho de João

O quarto evangelho é o de João, considerado o mais notável e importante, pois foi escrito para afirmar a divindade de Cristo.

Esse evangelho é composto por vinte e um capítulos que tratam de Cristo de forma diferente dos outros três. Os estudiosos afirmam que foi escrito entre os anos 68 e 98 d.C. (alguns dizem até depois disso). A Igreja atribui esse evangelho a João, o pescador.

O idioma desse evangelho — por consenso — é o grego. Quanto ao local da redação, há divergências: alguns dizem que foi escrito na Turquia, especificamente em Éfeso ou Antioquia; outros afirmam que foi em Alexandria.

Quem é João, o Pescador?

João, filho de Zebedeu, era pescador da Galileia. Ele e seu irmão Tiago seguiram a Cristo. Sua mãe, Salomé, era parente próxima de Cristo, e alguns editores do Dicionário da Bíblia consideram-na irmã de Maria, mãe de Jesus.
Dizem que João viveu até o final do primeiro século. O historiador Irineu afirma que ele viveu até o ano 98 d.C. A Igreja relata que ele escreveu seu evangelho em Éfeso pouco antes de sua morte.

Provas dos cristãos sobre a autoria do evangelho por João

A Igreja apresenta algumas provas para confirmar que o evangelho foi escrito por João, conforme registraram os editores do Dicionário da Bíblia:

  1. O autor do evangelho era judeu palestino, o que se percebe pelo seu conhecimento detalhado da geografia da Palestina, de diversos lugares em Jerusalém, e da história e costumes judaicos. Também se nota no estilo grego do evangelho certas influências semíticas.
  2. O autor era um dos discípulos de Cristo, algo evidente pelo uso da primeira pessoa do plural e pela menção de muitos detalhes íntimos sobre as obras de Cristo e os sentimentos de seus discípulos. Em João 21:24 se deixa claro que o autor foi um dos discípulos de Cristo.
  3. O autor era o discípulo a quem Cristo amava — e este discípulo era o próprio João.

O autor do evangelho expõe o motivo de sua redação ao dizer:
“Estes, porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (João 20:31).

Os editores do Dicionário da Bíblia acrescentam:
“O outro motivo que levou à redação do quarto evangelho foi fortalecer a Igreja primitiva na fé quanto à verdadeira divindade e humanidade de Cristo, bem como refutar heresias que já haviam se infiltrado na Igreja, como as dos docetistas, gnósticos, cerintianos e ebionitas… Por isso, sua finalidade era afirmar a divindade de Cristo.”

Esse evangelho enfrentou forte oposição quanto ao reconhecimento de sua canonicidade. Por isso, o Dr. Post, no Dicionário da Bíblia, saiu em sua defesa, dizendo:
“Alguns incrédulos negaram a canonicidade deste evangelho por rejeitarem seu ensinamento espiritual, sobretudo sua clara afirmação sobre a divindade de Cristo. Mas o testemunho de sua autenticidade é suficiente.

Pedro faz referência a um versículo dele (2 Pedro 1:14; João 21:18). Inácio e Policarpo citam de seu espírito e conteúdo, assim como a Carta a Diogneto, Basílio, Justino Mártir e Taciano. Esses testemunhos remontam à metade do século II.

Com base nesses testemunhos e no próprio conteúdo do livro, que concorda com o que sabemos da vida de João, concluímos que saiu de sua pena. Do contrário, o autor teria que ser de extrema astúcia e engano, o que é difícil de acreditar, pois quem pretende enganar o mundo não poderia ser um homem espiritual.”

Negação da Autenticidade da Atribuição do Evangelho a João

Os estudiosos se dedicaram a investigar a atribuição do evangelho a João e a identificar seu verdadeiro autor. Muitos deles negaram que tenha sido escrito pelo apóstolo João, baseando-se em vários argumentos, entre os quais:

  1. Existia já uma negação antiga dessa atribuição.
    Várias seitas cristãs antigas rejeitavam que o evangelho fosse de João, como a seita dos Alogi no século II. O autor de Senhor da Glória afirma:
    “Os que negavam a divindade de Cristo viam no evangelho de João um grande obstáculo. Nos primeiros séculos, os hereges rejeitavam João.”

A Enciclopédia Britânica também comenta:
“Há um testemunho positivo a favor dos que criticaram o evangelho de João: na Ásia Menor havia, por volta do ano 165 d.C., um grupo de cristãos que se recusava a reconhecer que João fosse o autor do evangelho, atribuindo-o a Cerinto (o herege). Não há dúvida de que essa atribuição estava equivocada.

Mas a questão é: como poderia tal comunidade cristã, tão numerosa que São Epifânio (374–377 d.C.) lhe dedicou longas páginas, chamando-a de ‘Alogi’ (isto é, opositores do Evangelho da Palavra), ter sustentado tais teorias naquela época e naquela região, se a autenticidade do evangelho fosse indiscutível? Certamente não.”

Além disso, Justino Mártir, em meados do século II, falou de João mas não mencionou que tivesse escrito um evangelho. Teófilo de Antioquia (c. 165 d.C.) citou o evangelho de João, mas não o atribuiu a ele.

Até mesmo diante de Irineu — discípulo de Policarpo, que por sua vez foi discípulo de João — houve quem negasse a autoria joanina. Irineu não rebateu os opositores, o que seria estranho se tivesse ouvido de Policarpo sobre a existência de um evangelho de João.

  1. A crítica continuou por séculos.
    Muitos estudiosos, em épocas sucessivas, rejeitaram a atribuição do evangelho a João.

A Enciclopédia Francesa declara:
“Este evangelho, assim como outras três obras do Novo Testamento, é atribuído a João. Contudo, as pesquisas modernas sobre religiões não aceitam essa atribuição como autêntica.”

O pastor indiano Barakatullah escreveu em A Bandeira da Cruz e a Falsificação da Verdade:

“A realidade é que os estudiosos não aceitam, sem exame e investigação, a teoria de que o autor do quarto evangelho foi São João, filho de Zebedeu. Os críticos, de modo geral, divergem dessa teoria.”

A Enciclopédia Britânica também afirma:

“O evangelho de João é, sem dúvida, um livro espúrio. Seu autor quis opor dois apóstolos, Mateus e João… Lamentamos pelos que se esforçam ao máximo para ligar, mesmo com o elo mais frágil, esse escritor filosófico do século II ao apóstolo João, o pescador galileu. Seus esforços são vãos, pois se baseiam em confusão e falta de orientação.”

  1. O estilo e o conteúdo não correspondem a um pescador galileu.
    O evangelho de João tem traços gnósticos e reflete a teoria do emanacionismo encontrada em Filon de Alexandria.

Não seria possível que João, descrito em Atos 4:13 como “sem instrução e iletrado”, tivesse escrito tal obra.

  1. A própria conclusão do evangelho contradiz a autoria de João.
    O texto afirma:
    “Este é o discípulo que dá testemunho destas coisas e que as escreveu, e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro” (João 21:24).

Os estudiosos observam que aqui se fala de João em terceira pessoa, o que indica que ele não foi o autor.

O pesquisador West defende que esse trecho era originalmente uma nota marginal acrescentada depois ao texto, possivelmente pelos anciãos de Éfeso.
Bruce Metzger (e outros como Bousset) concordam, destacando que esse versículo não aparece no Códice Sinaítico.

A introdução da Bíblia da Escola Bíblica Jesuíta também admite que tanto esse versículo quanto o seguinte são adições posteriores, reconhecidas por todos os intérpretes.

O renomado B.H. Streeter, em Os Quatro Evangelhos, afirma que tais acréscimos tinham o objetivo de forçar o reconhecimento de uma teoria contestada naquela época quanto ao autor do evangelho.

  1. Problema cronológico.
    Alguns historiadores — entre eles Charles Alfred e Robert Eisler — afirmaram que João foi enforcado em 44 d.C. por ordem de Herodes Agripa I. Se isso for verdadeiro, ele não poderia ser o autor do evangelho, que foi escrito apenas no final do século I ou início do século II.


Quem escreveu o Evangelho de João?

E se João não foi o autor do evangelho, quem é o verdadeiro escritor?

Responde o reverendo Faheem Aziz em sua introdução ao evangelho:
“Esta questão é difícil, e a resposta a ela exige um estudo amplo que geralmente termina com a frase: só Deus sabe quem escreveu este evangelho”.

Alguns tentaram responder à questão determinando as características do autor do evangelho sem mencionar um nome específico. Grant diz:
“Era cristão, além disso era helenista, e provavelmente não era judeu, mas oriental ou grego. Percebemos isso pela ausência de lágrimas em seus olhos como sinal de tristeza ao escrever sobre a destruição de uma cidade judaica”.

E consta na introdução do evangelho que alguns críticos “deixam o nome do autor e o descrevem como um cristão que escreveu em grego no final do primeiro século nas igrejas da Ásia”.

John Marsh, intérprete do Evangelho de João em seu comentário (p. 81), disse:

“E é provável que, durante os últimos dez anos do primeiro século d.C., uma pessoa chamada João — possivelmente João Marcos, ao contrário do que é comum dizer que seria João filho de Zebedeu — tenha reunido muitas informações sobre Jesus. É provável que ele tivesse conhecimento de um ou mais dos evangelhos sinóticos, e então fez um novo registro da história de Jesus, específico para sua própria comunidade, que se considerava universal, e também influenciada pela presença dos discípulos de João Batista”.

O crítico Bretschneider (†1848) disse:

“Todo este evangelho, assim como as epístolas de João, não são de sua autoria, mas foram escritos por alguém no início do segundo século, e atribuídos a João para que as pessoas o aceitassem”.

Stäudlin concorda com ele e considera que o autor era “um aluno da escola de Alexandria”.

Youssef Khoury disse em A Jóia da Geração que o autor do evangelho foi um discípulo de João chamado Proclo.

Alguns estudiosos, como James Moffatt e Streeter em seu livro Os Quatro Evangelhos, disseram que o João em questão era outro discípulo de Cristo, o “João o Presbítero”, e que Irineu, que atribuiu o Evangelho de João ao filho de Zebedeu, teria confundido os dois discípulos.

George Elton mencionou em seu livro O Testemunho do Evangelho de João que o autor deste evangelho era um de três: um discípulo do apóstolo João, ou João o Ancião (e não o apóstolo), ou um grande mestre desconhecido de Éfeso.

Mas isso não abalou a convicção de Elton, que ainda considera o Evangelho de João sagrado, porque “quaisquer que sejam as teorias sobre o autor deste evangelho, o que se torna claro para nós é que o autor tinha a visão do apóstolo. Se foi escrito por um de seus discípulos, ele certamente estava imbuído de seu espírito…”.

Alguns pesquisadores também sugeriram a existência de mais de um autor do evangelho, como Colmann, que disse:

“Tudo leva a crer que o texto atualmente publicado pertence a mais de um autor. É possível que o evangelho, na forma que temos hoje, tenha sido publicado pelos discípulos do autor, que também acrescentaram a ele”. O mesmo é dito na introdução ao Evangelho de João.

De tudo isso ficou provado que o Evangelho de João não foi escrito pelo apóstolo João, e que seu verdadeiro autor é desconhecido. De forma alguma é correto atribuir infalibilidade e santidade a um escritor desconhecido de identidade ignorada.

E mesmo deixando de lado o anonimato do autor e a impossibilidade de afirmar sua infalibilidade, ainda surgem problemas neste evangelho, apontados pelos estudiosos, entre eles:

A diferença deste evangelho em relação aos outros três, apesar de o tema dos quatro evangelhos ser a história e a vida de Cristo.

Enquanto a história de Cristo é semelhante nos três evangelhos, o quarto evangelho aparece estranho em relação a eles.

Por exemplo: é o único evangelho em que aparecem textos que divinizam Cristo, e foi escrito para provar isso, como diz o intérprete Youssef Khoury:
“João escreveu seu evangelho no fim de sua vida a pedido dos bispos das igrejas da Ásia e de outros lugares. O motivo foi que existiam seitas que negavam a divindade de Cristo”.

E como não havia nos três evangelhos nada que refutasse as afirmações dessas seitas, João escreveu seu evangelho. Esse significado é confirmado por Gerges Zewain, que menciona sobre os bispos da Ásia que eles se reuniram “e pediram-lhe que escrevesse sobre Cristo e proclamasse um evangelho diferente do que os outros evangelistas haviam escrito”.

O padre Roguet diz em seu livro Introdução ao Evangelho:
“É um mundo à parte, pois difere dos outros evangelhos na escolha dos temas, nos discursos, no estilo, na geografia, na história e até na visão teológica”.

Essa diferença levou-o a apresentar uma imagem de Cristo totalmente distinta da dos três evangelhos, que alguns chamam de “sinóticos” ou “paralelos”.

Por isso, a Enciclopédia Americana diz:

“É difícil conciliar este evangelho com os outros três; se admitirmos que estes são verdadeiros, teríamos que concluir que aquele é falso”.

Sir Arthur Findlay, em seu livro O Universo Desvendado, expressa essa diferença dizendo:

“O Evangelho de João não tem valor digno de nota no relato de fatos reais, e seu conteúdo mostra que a imaginação do autor desempenhou nele um grande papel”.

Outro problema deste evangelho é que foi adulterado, sendo acrescentada a história da mulher adúltera (ver João 8:1-11), sobre a qual a introdução da Bíblia dos Jesuítas diz:

“Há consenso de que ela provém de uma fonte desconhecida e foi inserida em época posterior”. Essa passagem foi excluída da versão inglesa revisada RSV por ser considerada uma interpolação.

Além disso, muitos estudiosos acreditam que o último capítulo não foi escrito pelo autor do evangelho. Cronis diz:

“Este evangelho tinha vinte capítulos, e a Igreja de Éfeso acrescentou o capítulo vinte e um após a morte de João”.

Isso é reconhecido pelos autores da introdução da Bíblia dos Jesuítas, que consideram o capítulo vinte como a conclusão do evangelho, e o capítulo vinte e um como um apêndice. Sobre ele, dizem:
“Este último capítulo, que aparece após a conclusão de 20:30-31, tem a forma de um apêndice, e sua origem ainda é objeto de debate… Pode ser que este capítulo tenha sido acrescentado por alguns discípulos de João”.

Assim, chegamos com o leitor a uma conclusão clara como o sol ao meio-dia: a atribuição dos quatro evangelhos aos discípulos de Cristo é uma questão “que levanta dificuldades de todos os tipos. Hoje, os evangelhos são vistos, em conjunto, como livros de autoria desconhecida”. E essa é a verdade.

Dr. Munqidh As-Saqqar


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